Encanadores, pedreiros,
carpinteiros, serralheiros, eletricistas, pintores e ladrilheiros.
Profissionais que, além de compartilhar o local de trabalho, sofrem de um mesmo
problema: a carência de condições de segurança quando operam em obras de
pequeno porte. A conclusão é da tese de doutorado Construção civil e saúde do
trabalhador: um olhar sobre as pequenas obras, apresentada na Escola Nacional
de Saúde Pública (Ensp/ Fiocruz). O estudo analisa as políticas de segurança e
saúde do trabalhador em pequenos canteiros e revela que as obras de menor
porte, em comparação com as maiores, são menos visíveis à sociedade e à
fiscalização. Para a tese, foram entrevistados, entre março e junho do ano
passado, profissionais de diversas áreas de formação e níveis de atuação na
indústria de construção civil, no Rio de Janeiro. Entre eles, engenheiros,
médicos do trabalho, técnicos de segurança, mestres e encarregados de obras,
sindicalistas, auditores, síndicos e trabalhadores.
A indústria da construção
apresenta índices significativos de ocorrência de acidentes do trabalho. Dados
da Previdência Social apontam que, em 2008, foram registrados 747.663
acidentes, dos quais 49.191 ocorreram no setor de construção, correspondendo a
6,58% do total dos acidentes laborais no país. Em 2010, ocorreram 846 acidentes
do trabalho fatais no Brasil, sendo 30% do total somente na construção civil. E
os números crescem a cada ano. Entre 2008 e 2009, houve aumento de 1.312
acidentes no setor, tanto nas pequenas quanto nas grandes obras. Nas de maior
porte, o crescimento foi de 28% entre 2007 e 2009, enquanto nas de menor porte
foram 35% acidentes a mais durante o mesmo período.
Os principais acidentes na
indústria de construção civil são as quedas, os acidentes perfuro-cortantes e
eletrocussão, provocados por inadequação dos andaimes, plataformas e guinchos,
instalações elétricas precárias e deficiência de pessoal habilitado. Nos
canteiros de obras, não é raro o acúmulo de materiais pontiagudos e escombros,
além de limpeza deficiente e falta de dispositivos de proteção, rampas e
passarelas, conforme revela o estudo. Para o autor da tese, Haroldo Gomes, a
compreensão dos fatores que produzem os acidentes no setor é essencial, dado o
conjunto de riscos ocupacionais que a indústria de construção civil expõe à
saúde dos trabalhadores devido à grande quantidade de atividades envolvidas no
canteiro de obras e à sua falta de gerenciamento.
Problemas e soluções nas pequenas
obras
A falta de atenção necessária à
segurança e saúde do trabalhador de pequenos canteiros remete ao processo das
relações de trabalho estabelecidas ao longo dos séculos no país. Segundo Gomes,
a escravidão deixou como herança a desvalorização do trabalho braçal, afetando
a relação entre empregadores e empregados na sociedade contemporânea
brasileira. "As relações de trabalho no Brasil ainda, em muitos cantos,
são do tipo patrão-empregado, não se criando, nessa relação, a harmonia
necessária para o desenvolvimento de ações proativas para o trabalhador e para
o processo de trabalho em si", explica.
Outro fator que, conforme mostra
o estudo, cria espaço para a falta de segurança nas pequenas obras é o
desconhecimento de determinações da Normativa NR18, que versa sobre a segurança
na construção civil. "Itens como cinto de segurança, capacete, luvas e
botas são tudo que a maioria dos engenheiros conhecem", constata Gomes,
que, como solução para o problema, sugere maior abordagem sobre a
regulamentação em cursos de graduação e pós-graduação em engenharia e
arquitetura.
O estudo também indica
necessidade de adequação da NR18 às características próprias das pequenas
obras. "A simplicidade da forma, aliada à simplificação do conteúdo da
normativa, poderia atender tanto aos níveis gerenciais quanto aos próprios
trabalhadores", propõe o estudioso. Outra ideia seria, segundo ele, a
criação de uma lei específica para pequenas obras englobando apenas os itens
mais relevantes de segurança ou a adoção de um programa de condições e meio
ambiente de trabalho simplificado para esse tipo de obras, a partir do qual
seria elaborada uma cartilha com conteúdo didático e explicativo para os
trabalhadores.
Outro problema agravante da
situação nas obras de menor porte é o crescimento do assalariamento sem
carteira assinada e do trabalho autônomo. "Sem experiência, sem
orientação, sem respaldo legal, os trabalhadores se expõem mais facilmente às
condições adversas e ao risco de acidentes", explica Gomes. O estudo
mostra ainda que a terceirização dos serviços, muito comum no setor, favorece a
falha na comunicação, uma vez que leva aos canteiros equipes cujo contato com
as demais é restrito. Para minimizar esse aspecto, o estudioso sugere o uso do
Diálogo Diário de Segurança. "Às vezes bastam cinco minutos no início do
dia para conversar com os trabalhadores e repassar as informações mais
importantes sobre a segurança e a prevenção dos acidentes naquela etapa da
obra", afirma.
Consciência, aprendizado,
conhecimento, fiscalização e orientação são as palavras-chave para a melhoria
das condições de segurança e saúde dos trabalhadores nos pequenos canteiros de
obra. Porém, para mudar de fato o atual panorama da situação dos profissionais,
é preciso algo mais. "A luta pela saúde no trabalho ainda se encontra,
muitas vezes, restrita a alguma forma de atuação sindical, ou então é percebida
como uma questão de custos e penalizações financeiras, quando, na verdade,
precisa ser vista como algo mais abrangente e referente à saúde pública",
conclui Gomes.
Data: 22/10/2012 / Fonte: Agência Fiocruz de
Notícias
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